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Pesquisadores analisam uso de cetamina contra depressão

Mais médica e pouco focada na psicoterapia, terapia com a droga difere de abordagens com outros psicodélicos

Flávia Feitosa, para a Psicodelicamente

Foto: Freepik

Estudos científicos recentes apontam resultados promissores para o tratamento de distúrbios depressivos com psicodélicos. No Brasil, por exemplo, tem crescido a aplicação da cetamina, nas formas endovenosa ou subcutânea, autorizada para uso off-label.

Mas o tratamento da depressão empregado no caso da cetamina difere das práticas geralmente usadas com substâncias psicodélicas clássicas, principalmente pela abordagem mais médica e pouco focada na psicoterapia. 

Esta é a conclusão do artigo “Therapeutic Protocols Using Ketamine and Esketamine for Depressive Disorders: A Systematic Review” publicado em agosto de 2023 no Journal of Psychoactive Drugs, de autoria de pesquisadores da PUC-Rio, UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e do King’s College, de Londres.

O tema é relevante, pois como a cetamina não é proibida, representa uma alternativa para quadros depressivos que afetam pelo menos 5% da população global adulta. A doença é uma das principais causas de incapacidade, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde). 

O tratamento da depressão normalmente envolve psicoterapia e medicação antidepressiva, mas os efeitos são pequenos a moderados. Uma outra questão é que farmacologicamente os tratamentos têm um número importante de limitações, entre eles o tempo que demoram para atingir o completo efeito terapêutico em pacientes que podem estar em situação de risco. 

Também já é sabido que pelo menos um terço dos pacientes com depressão não respondem à medicação por serem resistentes aos antidepressivos. 

Tudo isto configura-se como um grande problema para a saúde pública. Portanto, avaliar como estão caminhando pesquisas para novos tratamentos com outras drogas e protocolos promissores, é muito importante. 

Foi essa percepção que motivou o artigo sobre cetamina no Journal of Psychoactive Drugs, que faz uma revisão sistemática das publicações sobre o tema a partir de uma seleção das publicações sobre os tratamentos com a droga para distúrbios depressivos. 

Foram identificados mais de mil artigos no PubMed e Web of Science, plataformas de acesso aos mais renomados artigos científicos. Ao final, 43 estudos foram incluídos na revisão. 

Os estudos elegíveis atenderam a critérios como serem ensaios clínicos com cetamina randomizados e controlados, com participantes adultos e diagnóstico de transtorno depressivo maior.

A análise das publicações avaliou os procedimentos médicos e os profissionais envolvidos, preparo e integração, setting, abordagem psicoterapêutica, tipo de medicamento e dosagem, formas de amostragem e alimentação durante ou anterior às sessões. 

Entre os achados, destaca-se a falta de esclarecimento sobre a presença de psiquiatras e psicólogos nas sessões comparado a atenção dada para a presença de enfermeiras e anestesistas. Pouca ou nenhuma informação é fornecida sobre o ambiente de administração. 

Fala-se mais sobre onde do que sobre as características dos settings. Há pouco sobre a formação ou abordagem terapêutica utilizada. Apenas dois artigos mencionam a terapia cognitivo-comportamental (focada em examinar a percepção da pessoa sobre suas experiências). 

A integração após a sessão com a substância é citada por apenas um artigo, e nenhum deles sequer menciona as sessões de preparo para a experiência.  

No geral, os resultados mostraram predominância de uma abordagem médica, com poucos estudos sobre a psicoterapia assistida por cetamina e outras modalidades de terapia usada com psicodélicos. 

Notou-se também uma limitação de informações sobre elementos psicossociais como preparação, suporte psicológico durante as sessões e integração da experiência​​, demonstrando que está se dando menos importância a esses aspectos. 

Fica claro que há ainda um longo caminho pela frente, mas que pode ser muito promissor. Precisa-se colonizar as pesquisas científicas com muito mais psicoterapia, ampliando a parceria entre a medicina e a psicologia.

 

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Flávia Feitosa

Flávia Feitosa é doutora pela USP (Universidade de São Paulo) e mestre em psicologia social pela London School of Economics and Political Science, graduada em psicologia pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) e especialista em processos grupais e em gestão educacional. É professora na ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), na FGV (Fundação Getúlio Vargas) e na Casa do Saber. Atuou por duas décadas como executiva em multinacionais e no mercado educacional brasileiro. Está em processo de formação em PAP (Psicoterapia Assistida por Psicodélicos) pelo Instituto Phaneros e atua como psicóloga, psicoterapeuta e consultora focada em desenvolvimento de pessoas, líderes e times. É colaboradora e consultora científica da Psicodelicamente.

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