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A ciência da microdose

Evidências ainda frágeis apontam efeitos farmacológicos diretos em doses reduzidas, incluindo melhores indicadores de saúde mental

Flávia Feitosa, para a Psicodelicamente

Foto: Freepik

“É precoce afirmar que os efeitos da microdosagem de psicodélicos se devem exclusivamente a vieses e expectativas, como o efeito placebo”, afirmam Vince Polito e Paul Liknaitzky, autores do artigo “A ciência emergente da microdosagem”, de 2022, publicado no periódico “Neuroscience & Behavioral Reviews, e disponível no Science Direct (banco de dados sobre ciência, com artigos de periódicos revisados ​​por pares e capítulos de livros).

Segundo os pesquisadores das universidades Macquarie e Monash, na Austrália, evidências apontam para efeitos farmacológicos diretos em doses reduzidas, incluindo maior tolerância à dor, melhores indicadores de saúde mental, redução de consumo de substâncias, aumento da criatividade, melhora do humor, mais conexão social, benefícios cognitivos, aprimoramento de processamento emocional e aumento de energia. 

O artigo faz uma revisão sistemática dos estudos sobre o uso de psicodélicos em baixas doses. O objetivo é avaliar os efeitos potenciais destes tratamentos e oferecer recomendações para estabelecer critérios de pesquisa mais rigorosos e avanço científico neste campo.

De um total de 1.140 artigos publicados entre 1955 e 2021, 44 satisfizeram os critérios de inclusão, definidos como: uso de psicodélicos ‘clássicos’ ou serotoninérgicos; doses caracterizadas como microdoses ou relatos de efeitos sub-alucinogênicos sem comprometimento funcional; consideração de fatores psicológicos ou dados neurobiológicos; apresentação de dados empíricos primários; estudos envolvendo humanos; e artigos submetidos à revisão por pares. 

Segundo os autores, esta revisão encapsula as pesquisas mais cientificamente relevantes sobre microdosagem até a data. A primeira contribuição da pesquisa está no filtro. Apenas um pequeno volume de estudos publicados é, de fato, considerado relevante para a pesquisa de efeitos psicológicos ou neurobiológicos de microdosagem de psicodélicos em humanos, compatível com a complexidade em se obter um consenso no tema. 

A segunda contribuição é a categorização dos efeitos relatados, que inclui seis áreas: humor e saúde mental, bem-estar e atitude, conhecimento e criatividade, personalidade, mudanças no estado de consciência, e neurobiologia e fisiologia.

A terceira contribuição proposta é a adoção de práticas de ciência aberta, incluindo a transparência metodológica e a divulgação dos dados, além do diálogo com as populações indígenas, tema tão caro para o campo psicodélico. 

Outras recomendações incluem estabelecer faixas de dosagem para as diferentes substâncias, por exemplo entre 0,1 e 0,5 gramas de cogumelo cubensis seco; distinguir e avaliar frequência e esquema de dosagem; trocar a menção à microdosagem como “sub-perceptiva” por “sub-alucinógena” sem perda de funcionalidade.

Pesquisadores também sugerem promover a pesquisa com placebo, que no caso da macrodosagem tem utilização questionável pelos efeitos explícitos das substâncias em grandes quantidades; buscar amostras populacionais representativas; e fazer estudos longitudinais. 

Os autores ressaltam que para validar ou refutar benefícios, pesquisas adicionais são essenciais, assim como o aprimoramento dos métodos investigativos. Portanto, aguarda-se ansiosamente pelos próximos estudos no campo da microdosagem.

 

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Flávia Feitosa

Flávia Feitosa é doutora pela USP (Universidade de São Paulo) e mestre em psicologia social pela London School of Economics and Political Science, graduada em psicologia pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) e especialista em processos grupais e em gestão educacional. É professora na ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), na FGV (Fundação Getúlio Vargas) e na Casa do Saber. Atuou por duas décadas como executiva em multinacionais e no mercado educacional brasileiro. Está em processo de formação em PAP (Psicoterapia Assistida por Psicodélicos) pelo Instituto Phaneros e atua como psicóloga, psicoterapeuta e consultora focada em desenvolvimento de pessoas, líderes e times. É colaboradora e consultora científica da Psicodelicamente.

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