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Maracás, mulheres e Amazônia no centro do debate

Primeiro dia de festival indígena em Arujá reúne lideranças femininas em roda de conversa sobre espiritualidade, resistência e afirmação de saberes ancestrais

Carlos Minuano, de Arujá (SP) para a Psicodelicamente

Foto: Clara Nana/Psicodelicamente

“Esperamos fazer uma COP30 não somente na Amazônia, mas da Amazônia, que venha dos povos indígenas, que seja feita por nós, e onde a floresta esteja no centro das decisões”, disse Txai Suruí na abertura do Festival Indígena União dos Povos (Fiup), que começou nesta quinta-feira, 1º de maio, em Arujá (SP). Ao som dos maracás e sob o chamado ancestral das lideranças femininas, o evento deu início a quatro dias de encontros, rituais, debates e celebrações com representantes de 17 povos indígenas de todo o país.

A primeira roda de conversa do festival — “Corpo e Território: o protagonismo das mulheres indígenas” — destacou a força da atuação política, espiritual e cultural das mulheres originárias. A mesa contou com a presença de Célia Xakriabá, deputada federal e atual presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher na Câmara dos Deputados; Txai Suruí, jovem liderança reconhecida internacionalmente; Rana Kariri-Xocó, que atua com a jurema sagrada; e Joênia Wapichana, presidenta da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e pioneira na representação política indígena no Congresso.

“A escola está em muitos lugares, está dentro das pessoas. O primeiro livro que eu li foi meu avô”, afirmou Célia Xakriabá, abrindo o diálogo com reflexões sobre os saberes ancestrais e a educação indígena. Doutora em antropologia pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e uma das vozes mais influentes da política indigenista atual, Célia destacou ainda a importância de ocupar espaços institucionais para garantir direitos e visibilidade aos povos originários.

Já Rana Kariri-Xocó chamou atenção para a necessidade de respeito às medicinas da floresta: “Sou uma das primeiras mulheres a trabalhar com a jurema. É preciso cuidado com as medicinas, é preciso muito respeito”, alertou, apontando os riscos da apropriação indevida e da banalização dos saberes tradicionais.

Joênia Wapichana recuperou a memória recente da exclusão política: “Políticos só lembravam de indígenas em época de eleição. Levavam churrasco, bola, chocolate e até bebida alcoólica. Quando se elegiam, esqueciam das aldeias e aprovavam projetos anti-indígenas a favor de mineradoras e madeireiros”.

Segundo ela, foi diante desse cenário que lideranças perceberam a urgência de ocupar a política institucional. Joênia foi a primeira mulher indígena eleita deputada federal no Brasil (2019–2022) e atualmente dirige a Funai.

A mesa, mediada pela jornalista Caroline Apple, marcou o tom do festival, que segue até domingo com uma programação que inclui rodas de conversa, apresentações culturais, exposições, feira de artesanato, cerimônias com medicinas da floresta e o show de encerramento da cantora Maria Gadú.

A cobertura da Psicodelicamente no Fiup tem apoio do LIS (Lar e Integração do Ser) e é realizada em parceria com a Bari Filmes.

Carlos Minuano

Jornalista e escritor, há mais de duas décadas escreve sobre psicodélicos nos principais veículos jornalísticos do país, como nas revistas CartaCapital, Rolling Stone, jornal Metro. É colaborador do portal UOL desde 2012. Além de dirigir a Psicodelicamente, atualmente trabalha na pesquisa para um livro sobre psicodélicos, que será publicado pela editora Elefante. É autor de duas biografias, “Tons de Clô” (do estilista Clodovil Hernandes) em adaptação para uma série de streaming, e “Raul por trás das canções” (do músico Raul Seixas), ambas publicadas pelo grupo editorial Record.

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