Um protesto marcou o final do Psychedelic Science 2023, organizado pela Maps (Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos) na noite de sexta, 23, em Denver, no Colorado (EUA).
Um grupo interrompeu a última sessão capitaneada pelo cabeça da Maps, Rick Doblin, e subiu ao palco do maior evento sobre psicodélicos da história. Sob vaias e aplausos, falas em defesa dos saberes indígenas ecoaram uma tensão que há tempos bate à porta da chamada renascença psicodélica.
“Onde estão os indígenas?”, indagou no palco, Angela Beers, psicóloga clínica que dá aulas na universidade budista Naropa (Boulder, Colorado), que liderou o grupo, ao lado do equatoriano Kuthoomi Castro, que tocava um tambor. “Precisamos proteger nossa medicina”, prosseguiu ela.
Beers, que se identifica como indígena-mexicana da etnia Chichimeca, apontou para um ponto sensível, o embate entre o mainstream da ciência psicodélica e os povos tradicionais. Com um mercado milionário se estruturando em torno de patentes e de tratamentos psicodélicos, é cada vez mais evidente a tensão no campo psicodélico.
De um lado investidores e indústria farmacêutica estão de olho no lucro. Do outro, povos originários acusam o mainstream da ciência psicodélica de apropriação indevida de plantas psicodélicas de uso ancestral indígena, como o peiote e a ayahuasca.

Intervenção foi questionada por especialista
“Ninguém é dono da cura, você não é dono de nossa cultura, não pode tirá-la de nós”, bradou Beers, sob os holofotes do mega evento, e apontando para Rick Doblin, fundador da Maps. Mas, a intervenção foi questionada por especialistas presentes.
Embora concorde com a importância da necessidade de inclusão indígena, a antropóloga Bia Labate, do Instituto Chacruna, criticou os manifestantes – e esclareceu que só conhece Beers e Castro, não os demais que subiram ao palco.
“Protestos são naturais e saudáveis, e não deixa de ser irônico que a Maps, antes grande pioneira e revolucionária, agora encontre resistência e crítica”, disse.
“Achei sua intervenção tola, e curiosa, pois denunciaram exclusão de comunidades indígenas locais, quando eles mesmos não fazem parte de nenhuma delas”, acrescenta a antropóloga.
Labate declarou desconhecer que integrem alguma instituição indígena de boa fé, diferentemente de outros líderes indígenas reconhecidos e respeitados, incluídos na conferência. “Ironicamente, omitiram que não foram excluídos, pois tiveram participação nela [como painelistas]”, finaliza a antropóloga.
Com informações de Flávia Feitosa e do blog Virada Psicodélica, do jornalista Marcelo Leite, de Denver.